Na semana passada, a estatística das tragédias no trânsito aumentou com a morte de mais uma ciclista, desta vez na Avenida Paulista, em São Paulo.
E por que é tão arriscado andar de bicicleta no Brasil? Porque faltam ciclovias todos nós sabemos, mas tem alternativa? Dá para dividir o espaço nas ruas ou avenidas entre carros e bicicletas? Daria… se houvesse mais educação no trânsito, e sobretudo se o ciclista fosse respeitado como um motorista portando seu veículo de transporte, e não apenas aquele que passeia ou atrapalha o trânsito.
Se para um pedestre já é difícil atravessar em uma faixa de pedestres, quem dirá um ciclista, que não pode trafegar nem na calçada, nem na pista. Então, aonde pedalamos? Naquele micro espaço entre a calçada e a faixa da rua? Esta é a triste realidade de quem se aventura a andar de bicicleta no Brasil. Mas poderia ser diferente, e como seria lindo se tudo fosse diferente…
Nestas férias, experimentamos uma outra realidade. Nos Países Baixos, a regra é básica: quem tem a vez é o cavalo (como em Brugges, para transporte turístico), em segundo são os pedestres, em terceiro as bicicletas e, por último, os carros, que dentro das cidades só causam incômodo. A ordem é esta e as multas são caras. Simples não é? Nem tanto. Lá tem boa vontade política e planejamento urbano, respeito ao próximo, leis rigorosas e bom censo das pessoas.
Nós utilizamos a bicicleta não só como passeio, mas como meio de transporte em nossa rotina diária e, na Holanda, presenciamos o que poderia ser o ritmo de vida ideal: muitas, muitas ciclovias, e milhares de bikes circulando apressadamente, num trânsito nem um pouco caótico pela quantidade de magrelas. É preciso sempre estar atento para não bater, tampouco ser batido (pausa) por outras bicicletas.
Lá, vimos pessoas de 8 a 90 anos andando de bicicleta, e se o idoso não consegue mais pedalar numa bike normal, tem a opção das motorizadas. Como se vê na foto acima, toda a família cabe numa bike. E nos pontos estratégicos da cidade (estações de trem, metrô, aeroportos, centros comerciais) encontram-se os enormes estacionamentos.
Em outras cidades da Europa a paisagem muda, mas as bicicletas nunca saem de cena. Em Paris não há tantas ciclovias e o trânsito é mais caótico, com muitas motocicletas. Há também bikes de aluguel e com pouco mais de 1 euro por dia, você pega uma bike num lugar e devolve em outro.
Do filme Before Sunset, você lembrará deste lugar, o Le Pure Cafe. Em frente tem um ponto das bikes Vèlib.
As charmosas bikes vintage estão super na moda.
É difícil não ver uma bike nas famosas paisagens de Paris. A foto acima foi clicada enquanto estávamos sentados num banquinho e apreciando a Torre Eiffel. Na foto abaixo, estávamos em frente à livraria Shakespeare and Company, com fundos para a Catedral de Notre Dame, onde havia mais uma magrela estacionada.
Em Londres, vimos muitas dobráveis e bikes para alugar em vários pontos da cidade, mas não arriscamos pedalar por causa da mão inglesa. Lá, encontramos uma amiga que há tempos não víamos e ficamos até tarde num Pub. No final da noite nos despedimos e ela foi pra casa. Como? De bike. Perguntamos se era perigoso e ela prontamente nos respondeu: “Claro que não”! E tem mais, lá, as empresas oferecem “ecoChecks” para seus funcionários comprarem bikes com descontos. Legal, não é?
Se comparada com a Holanda, a Inglaterra tem menos ciclistas, mas repare na foto abaixo, no tamanho do estacionamento de bikes da estação de trem e metrô de Paddington.
O lugar onde mais aproveitamos para pedalar foi na Antuérpia, onde ficamos hospedados. Foi lá que vivenciamos com duas rodas e por poucos dias o ritmo da cidade, e foi inesquecível pedalar pelo parque Middelheim, assunto para outro post.
Na foto abaixo, a bela moça teve tempo suficiente para enviar uma mensagem enquanto esperava o sinal abrir. Ao fundo, crianças indo para a escola com suas bikes.
Para as pessoas que pedalam diariamente, a bicicleta é uma extensão de seus corpos, e sabemos que não é fácil importar a cultura da Europa para o Brasil, mas se houvesse mais vontade política e apoio da população, poderíamos ter mais ciclovias, remanejar as pistas para os carros e abrir espaços para corredores ciclísticos.
Andar de bicicleta no Brasil, seja em São José ou Florianópolis, ou São Paulo é muito difícil. O que deveria ser saudável torna-se insano, tanto pela aspiração excessiva de monóxido de carbono como pelo perigo. Mas quem precisa, gosta e quer usar este meio de transporte em sua rotina diária não irá desistir. Nem mesmo quando um governo (só para mostrar trabalho) constroi uma ciclovia que parte de um lugar para lugar nenhum, ou quando existe uma que simplesmente acaba no meio do caminho.
Nós temos consciência de que o Brasil é bem diferente da Europa. E também temos a certeza de que, com mais ciclovias e bicicletas nas ruas, podemos viver em um país bem melhor. Uma bicicleta na rua é um carro a menos. É simples, é necessário.
A foto abaixo é da obra do artista brasileiro Eduardo Srur, de 2007, na Avenida Paulista. É lindo, é lúdico, mas na prática não queremos observar as bicicletas no céu, queremos tê-las no chão e de preferência andando, e muito.
Para ver mais fotos deste post, acesse o nosso Flickr.
É uma outra concepção de vida e de cidade, né? No Brasil, o importante para as pessoas é mostrarem que são ricas, possuem carrões, estão “acima” dos outros, etc. Sem contar os problemas de ordem política — o lobby das indústrias que faturam milhões com carros, por exemplo. Infelizmente, não vejo luz no fim do túnel, no caso do Brasil…
Achei o texto todo muito pertinente, não é só uma divagação. A comparação é feliz, porque não serve pura e simplesmente pra enaltecer um outro modelo, mas embasa a crítica ao atraso brasileiro na questão. Penso em me somar aos que desafiam a morte só pela gostosura de pedalar – não para ir ao trabalho, porque Teresina beira os 40 graus em algumas épocas do ano e o trânsito é homicida. Só espero não entrar pra nenhuma estatística trágica por causa de um hobby!
Tecia
Oi Leila
Realmente, as pessoas acham que as pessoas andam de bike aqui na Holanda porque é algo cultural, porque os holandeses assim o fazem desde sempre e são acostumados, mas não é verdade. O uso regular de bikes e as ciclovias aqui são numerosas porque a população assim exigiu, há décadas atrás, justamente pelos mesmos problemas de mobilidade urbana, preocupação com o meio-ambiente e mortes nas estradas que temos aí no Brasil. Gostaria de compartilhar este vídeo com você, caso ainda não conheçam:
Obrigada pelos comentários que enriqueceram a reflexão sobre este assunto tão necessário! Legal este vídeo, Tecia! Dá até pra ter esperança de que um dia teremos nossas tão esperadas ciclovias.
Nós amamos bicicletas
Na semana passada, a estatística das tragédias no trânsito aumentou com a morte de mais uma ciclista, desta vez na Avenida Paulista, em São Paulo.
E por que é tão arriscado andar de bicicleta no Brasil? Porque faltam ciclovias todos nós sabemos, mas tem alternativa? Dá para dividir o espaço nas ruas ou avenidas entre carros e bicicletas? Daria… se houvesse mais educação no trânsito, e sobretudo se o ciclista fosse respeitado como um motorista portando seu veículo de transporte, e não apenas aquele que passeia ou atrapalha o trânsito.
Se para um pedestre já é difícil atravessar em uma faixa de pedestres, quem dirá um ciclista, que não pode trafegar nem na calçada, nem na pista. Então, aonde pedalamos? Naquele micro espaço entre a calçada e a faixa da rua? Esta é a triste realidade de quem se aventura a andar de bicicleta no Brasil. Mas poderia ser diferente, e como seria lindo se tudo fosse diferente…
Nestas férias, experimentamos uma outra realidade. Nos Países Baixos, a regra é básica: quem tem a vez é o cavalo (como em Brugges, para transporte turístico), em segundo são os pedestres, em terceiro as bicicletas e, por último, os carros, que dentro das cidades só causam incômodo. A ordem é esta e as multas são caras. Simples não é? Nem tanto. Lá tem boa vontade política e planejamento urbano, respeito ao próximo, leis rigorosas e bom censo das pessoas.
Nós utilizamos a bicicleta não só como passeio, mas como meio de transporte em nossa rotina diária e, na Holanda, presenciamos o que poderia ser o ritmo de vida ideal: muitas, muitas ciclovias, e milhares de bikes circulando apressadamente, num trânsito nem um pouco caótico pela quantidade de magrelas. É preciso sempre estar atento para não bater, tampouco ser batido (pausa) por outras bicicletas.
Lá, vimos pessoas de 8 a 90 anos andando de bicicleta, e se o idoso não consegue mais pedalar numa bike normal, tem a opção das motorizadas. Como se vê na foto acima, toda a família cabe numa bike. E nos pontos estratégicos da cidade (estações de trem, metrô, aeroportos, centros comerciais) encontram-se os enormes estacionamentos.
Em outras cidades da Europa a paisagem muda, mas as bicicletas nunca saem de cena. Em Paris não há tantas ciclovias e o trânsito é mais caótico, com muitas motocicletas. Há também bikes de aluguel e com pouco mais de 1 euro por dia, você pega uma bike num lugar e devolve em outro.
Do filme Before Sunset, você lembrará deste lugar, o Le Pure Cafe. Em frente tem um ponto das bikes Vèlib.
As charmosas bikes vintage estão super na moda.
É difícil não ver uma bike nas famosas paisagens de Paris. A foto acima foi clicada enquanto estávamos sentados num banquinho e apreciando a Torre Eiffel. Na foto abaixo, estávamos em frente à livraria Shakespeare and Company, com fundos para a Catedral de Notre Dame, onde havia mais uma magrela estacionada.
Em Londres, vimos muitas dobráveis e bikes para alugar em vários pontos da cidade, mas não arriscamos pedalar por causa da mão inglesa. Lá, encontramos uma amiga que há tempos não víamos e ficamos até tarde num Pub. No final da noite nos despedimos e ela foi pra casa. Como? De bike. Perguntamos se era perigoso e ela prontamente nos respondeu: “Claro que não”! E tem mais, lá, as empresas oferecem “ecoChecks” para seus funcionários comprarem bikes com descontos. Legal, não é?
Se comparada com a Holanda, a Inglaterra tem menos ciclistas, mas repare na foto abaixo, no tamanho do estacionamento de bikes da estação de trem e metrô de Paddington.
O lugar onde mais aproveitamos para pedalar foi na Antuérpia, onde ficamos hospedados. Foi lá que vivenciamos com duas rodas e por poucos dias o ritmo da cidade, e foi inesquecível pedalar pelo parque Middelheim, assunto para outro post.
Na foto abaixo, a bela moça teve tempo suficiente para enviar uma mensagem enquanto esperava o sinal abrir. Ao fundo, crianças indo para a escola com suas bikes.
Para as pessoas que pedalam diariamente, a bicicleta é uma extensão de seus corpos, e sabemos que não é fácil importar a cultura da Europa para o Brasil, mas se houvesse mais vontade política e apoio da população, poderíamos ter mais ciclovias, remanejar as pistas para os carros e abrir espaços para corredores ciclísticos.
Andar de bicicleta no Brasil, seja em São José ou Florianópolis, ou São Paulo é muito difícil. O que deveria ser saudável torna-se insano, tanto pela aspiração excessiva de monóxido de carbono como pelo perigo. Mas quem precisa, gosta e quer usar este meio de transporte em sua rotina diária não irá desistir. Nem mesmo quando um governo (só para mostrar trabalho) constroi uma ciclovia que parte de um lugar para lugar nenhum, ou quando existe uma que simplesmente acaba no meio do caminho.
Nós temos consciência de que o Brasil é bem diferente da Europa. E também temos a certeza de que, com mais ciclovias e bicicletas nas ruas, podemos viver em um país bem melhor. Uma bicicleta na rua é um carro a menos. É simples, é necessário.
A foto abaixo é da obra do artista brasileiro Eduardo Srur, de 2007, na Avenida Paulista. É lindo, é lúdico, mas na prática não queremos observar as bicicletas no céu, queremos tê-las no chão e de preferência andando, e muito.
Para ver mais fotos deste post, acesse o nosso Flickr.
5 respostas para “Nós amamos bicicletas”
Fabricio
É uma outra concepção de vida e de cidade, né? No Brasil, o importante para as pessoas é mostrarem que são ricas, possuem carrões, estão “acima” dos outros, etc. Sem contar os problemas de ordem política — o lobby das indústrias que faturam milhões com carros, por exemplo. Infelizmente, não vejo luz no fim do túnel, no caso do Brasil…
Alencar
Achei o texto todo muito pertinente, não é só uma divagação. A comparação é feliz, porque não serve pura e simplesmente pra enaltecer um outro modelo, mas embasa a crítica ao atraso brasileiro na questão. Penso em me somar aos que desafiam a morte só pela gostosura de pedalar – não para ir ao trabalho, porque Teresina beira os 40 graus em algumas épocas do ano e o trânsito é homicida. Só espero não entrar pra nenhuma estatística trágica por causa de um hobby!
Tecia
Oi Leila
Realmente, as pessoas acham que as pessoas andam de bike aqui na Holanda porque é algo cultural, porque os holandeses assim o fazem desde sempre e são acostumados, mas não é verdade. O uso regular de bikes e as ciclovias aqui são numerosas porque a população assim exigiu, há décadas atrás, justamente pelos mesmos problemas de mobilidade urbana, preocupação com o meio-ambiente e mortes nas estradas que temos aí no Brasil. Gostaria de compartilhar este vídeo com você, caso ainda não conheçam:
vídeo original em inglês: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=XuBdf9jYj7o
vídeo traduzido: http://www.youtube.com/watch?v=l1a_USVlXSE – ví
Tecia
Ah, e também gostaria de dizer que fiquei chateada pois vocês vieram pra Holanda e não vieram me visitar em Leiden! Seriam muito bem recebidos.
Corrupiola
Obrigada pelos comentários que enriqueceram a reflexão sobre este assunto tão necessário! Legal este vídeo, Tecia! Dá até pra ter esperança de que um dia teremos nossas tão esperadas ciclovias.
Sobre a visita, a resposta foi por email.